é um projeto teu? precisas de ajuda? posso ajudar? é para hoje? não tens mais ninguém? eu safo!
não, Joana. assim não vai dar. assim ficas com tempo para tudo menos para a tua própria vida. não tens tempo para um cafézinho com um amigo de quem nem tiveste tempo de perceber que tens saudades e com quem não falas há meses. nunca falaste com aquela grande amiga da faculdade que sabes que tem um novo namorado mas que já passou tanto tempo que nem faz sentido falar mais sobre isso. sem tempo para beber até cair, e rir. porque tens idade é para fazer tudo, enquanto a vida te permite, não é? e depois ficas sem tempo. sem tempo para nada, nem para pensar. nem para respirar, e muito menos para respirar fundo.
e lá se vai o pulmãozinho, que colapsa, que te põe numa maca de hospital. sem nada. nem a tua própria roupa. põe-te assim, sem sequer te deixar levantar pelo teu pé. e percebes que ao fim de poucas horas, já não tens o que pensar, já esgotaste o cérebro de pensar em tudo o que havia para pensar. só dor. foda-se.
ao fim de sete dias deitada numa enfermaria, dão-te alta. tiras aquela bata de hospital, vestes as calças de ganga e os ténis e sais vaidosa para a rua, como se fosse uma roupa especial, como se toda a gente com quem te cruzas na rua, fosse reparar que finalmente estás vestida, em vez daquela bata de hospital que vestiste durante sete dias!
frio na cara, gente na rua, o céu azul… parece tudo lindo. foda-se. não fosse este internamento e não repararia que as flores das árvores da minha rua já nasceram. e depois de sete dias parada, presa a um tubo que me aspirou os pulmões, percebo que está tudo bem, o mundo continuou e não há caso para pânico, ninguém morreu e nenhum projeto congelou por causa da pleura do meu pulmão.